terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Eternos incômodos


Vivemos uma vida buscando saciar nossos incômodos.

Incômodos relativos ao nosso corpo, à nossa imagem, aos nossos relacionamentos, enfim, ao nosso estilo de vida. Buscamos subterfúgios para estes incômodos criando quinquilharias tecnológicas que mais funcionam como muletas emocionais.

Se sofríamos com as distâncias, desenvolvemos automóveis, aviões, navios. Para que a distância fosse vencida de forma mais imediata, surgiram o telefone, a televisão, o rádio e mais recentemente a internet, o celular, os smartphones e assim vamos vencendo nossos incômodos.

Não são somente quinquilharias que criamos, mas nossa inteligência nos deu a capacidade de vencer alguns males. Doenças outrora fatais hoje são simples "incômodos". Equipamentos detectam tumores, infecções, vírus e assim conseguimos combatê-los com maior eficiência. O que matava em horas hoje é resolvido com uma simples vacina, um comprimido, uma droga.

Mas, maldição das maldições, o que criamos se volta contra nós. As invenções tecnológicas que nos dariam mais tempo para gozar a vida, hoje servem para nos escravizar. Se hoje fazemos mais atividades em menos tempo isso não significa que teremos mais tempo para gozar a vida mas sim, mais tempo para fazer mais atividades e assim talvez chegar ao final do dia com a frágil e efêmera sensação de que somos seres produtivos.

No entanto, ao chegar ao final do dia em uma reflexão mais cuidadosa e profunda, nosso sentimento é regularmente de impotência. Se fomos pais mais presentes, amigos mais próximos, talvez nossos insucessos profissionais nos sufoquem. Se dedicamos mais tempo ao trabalho, vazios emocionais começam a surgir na ausência de outros relacionamentos que não profissionais. Se atendemos aos apelos do deus mercado, vemos nossos dias se esvaindo na sucessão de horas dedicadas à produção de riquezas. Vivemos o dilema dos habitantes do inferno de Dante que ora se mantém sufocados sob o lago de fogo e enxofre e ora emergem para o imprescindível fôlego tendo seus corpos dilacerados por bestas feras à espreita de suas vítimas.

Vivemos em uma sofreguidão constante, uma fome insaciável, por preencher este vazio com mais e mais coisas. É a solução simples e rápida que encontramos em relacionamentos superficiais, ralos, efêmeros, no consumo exacerbado, no sucesso e na fama. Somos a geração que quer respostas rápidas, ainda que não sejam as melhores. É a fórmula da felicidade vendida em qualquer esquina, por curandeiros, ilusionistas, os líderes de nosso tempo.

No entanto, a frustração bate à porta quando descobrimos dia após dia, que o vazio somos nós mesmos. Vivemos assim buscando coisas e, no meio desta busca descobrimos que perdemos o que de mais valioso tínhamos no início da jornada: perdemos a nós mesmos, e tão longa foi a caminhada até aqui que já não sabemos onde voltar.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Egoísmo Evangélico - Chegamos à Nova Era?


"Ama-te a ti mesmo acima de todas as coisas e ao teu próximo que te encara no espelho!"

Sou do tempo em que temíamos a Nova Era. Seus símbolos, seus cânticos, seus ícones. Maitreya, o Anticristo, a Besta, representantes malignos da Era de Aquário a suplantar o Cristianismo, a enfrentá-lo abertamente em pleno Armagedom, ápice da Grande Tribulação, momento em que pré-tribulacionistas como eu esperavam estar gozando da glória eternal junto à Igreja Triunfante nos Céus.

No entanto a Nova Era já chegou! Há alguns anos, de forma sorrateira, perniciosa, sutil. No início glorificamo-la, saudamo-la, chamamo-la de benção, de provisão, fruto do toque de Jeová-Jireh, ao qual pervertemos considerando-o mera divindade, em uma quase confusão com Mamom. É Lúcifer mais uma vez, querendo ser Deus. É Mamom, confundindo-se com Jireh, o gênio da lâmpada neo-pentecostal.

No entanto este mensageiro de Satanás cresceu alimentado por nosso egoísmo e hoje assenta-se no grande trono. Eis a besta que emerge do mar com poder e grande autoridade a difamar o tabernáculo! Eis a besta que emerge da terra operando grandes sinais!

Essa nova era é a era do egoísmo evangélico em que não importa o corpo, o reino. Importa-me a minha dor, o meu prazer, hedonismo satânico em que sacio os meus desejos, transvestindo-os de "benção divina". Quero o que é meu, quero o que me pertence, tomo posse! Se preciso for, ergo meu trono acima de Deus. É o olho que olha para o ouvido e diz: não preciso de você! É o povo que busca a provisão, o carro, a casa, a cura, o marido de volta, o lar restaurado, não importa aonde, não importa como, não importa em quem. Povo cego que busca respostas sem saber que elas estão escritas na parede: MENE, MENE, TEQUEL e PARSIM. É esta a "burguesia que reduz a dignidade pessoal a simples valor de troca, que rasga o véu de emoção e de sentimentalidade das relações familiares por mera relação monetária, que substituiu a exploração disfarçada sob ilusões religiosas e políticas pela exploração aberta, cínica, direta e brutal." (Marx, Manifesto Comunista!??).

Este egoísmo criou uma nova geração de cristãos, interessados em seu mundo, que juntos com levitas e sacerdotes, não se contentam mais em passar ao largo mas escracham, pisoteam, vituperam o moribundo ao caminho. Chamam-no de derrotado, maldito, proscrito, esquecido de Deus.

E este egoísmo se prolifera em templos impessoais, tabernáculos do evangelho drive-thru, simples prestadores de serviços religioso-espirituais em que me viro para o irmão do lado e digo: "Jesus te ama e eu também" e que após este culto-show-apoteóse saio de lá me perguntando: Quem sou eu? Quem é você?

terça-feira, 22 de setembro de 2009

Falando a respeito de um país


Somos uma nação pacífica, cordial, gentil.

Habitamos uma bela terra e nela recebemos bem os melhores e os piores da terra. Não temos espaço para grandes dissensões e para conflitos éticos e eis aí nosso grande defeito.

Somos de fato uma nação, em geral, sem valores éticos. Somos uma nação que valoriza o que deveria ser resultado do trabalho mas não o trabalho em si.

Somos gentis e cordiais mas não sabemos amar.

Somos pacíficos por inação e não por algum valor.

Somos solidários no discurso e egoístas na ação.

Somos hospitaleiros por orgulho próprio e não por compaixão. Choramos a dor do outro com facilidade. Mas só choramos.

Somos hipócritas. Queremos refletir um lugar de paz mas não queremos refletores sobre nossas guerras urbanas.

Seja bem vindo. Este país se chama Brasil.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

ESTOU CANSADO!

Estou cansado!

Cansado de minha covardia.

Cansado de ouvir minhas ladainhas de protesto enquanto me escondo do vento gelado lá fora, fechando o vidro do carro e aumentando o volume do rádio que traz as últimas e vergonhosas declarações de senadores inescrupulosos.

Alguns carros ao lado talvez façam o mesmo tipo de protesto esdrúxulo e, cansados dos mesmos escândalos de sempre, coloquem um CD pirata para tocar uma música, singela representação da fajuta ética destes lados dos trópicos.

Tenho vergonha de ser brasileiro e ser representado por Sarney, Collor, Renan, Duques, castelos...enquanto fazemos os perfeitos papéis de bobos da corte!

Tenho vergonha de ser evangélico e ter nos mesmos currais lobos transvestidos em peles de cordeiros chamados Estevam, Sonia, Macedo, Malafaia, Morris Cerullo!

Tenho vergonha de meu silêncio e inação! Tenho vergonha de minha leniência!

Covardia!

Desprezo!

Desonra!

Denomine-se de que forma for, mas estamos impassíveis, enquanto nos indignamos na frente da TV com o escândalo do Senado, que só é assunto velho quando substituído pelo requentado escândalo da Universal.

Até quando teias de aranha crescerão sobre nossas faces esmaecidas que demonstrarão o quão fraco somos enquanto nação, sem causas próprias, ou pelo menos vergonhas comuns?

Marcos Paulo Sabiá

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Morre-se mais por desprezo



A Igreja Católica aconselhou seus fiéis, entre outras medidas, a evitarem o contato físico mais próximo como beijos, abraços e apertos de mão durante os serviços religiosos. A preocupação da Igreja é em evitar que as missas e demais eventos dentro dos templos se tornem meios de propagação do vírus Influenza A H1N1 ou gripe suína, que já vitimou mais de 800 pessoas em todo o mundo.

No entanto, digo que a Igreja errou. Errou ao propagar um vírus muito mais letal e pernicioso que o influenza. A Igreja com este ato propaga o vírus do desprezo, do abandono, do rosto virado, da falta de comunhão. O homem precisa de Deus e a presença de Deus neste mundo tem a minha face, o calor do teu beijo, o carinho do seu abraço.

Morre-se muito mais pela devassidão que assola o faminto por amor, que busca no sexo lascivo a paixão que já não lhe aquece o peito há tempos. Morre-se mais por abandono e desprezo das gentes que se dizem cristãs só porque Cristo é um nome com significado religioso em suas vidas. Morre-se mais, muito mais, por conta dos atos sorrateiros (por que não dizer secretos) cometidos nas límpidas salas do poder.

Matamos de fome, matamos na guerra, matamos por dinheiro, matamos por terra, matamos por poder. Matamos com o estampido das baionetas, com o estrondo das balas de canhão, matamos com o retinir do frio metal da guilhotina ou com o estalar da lenha a queimar bruxas e hereges.

Vaidades de vaidades, paradoxo de nossas maldições modernas, será que chegou a hora de temermos matar com um beijo, um abraço, um aperto de mão?

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Saudade de Deus


Você já sentiu saudade de Deus? Hoje me bateu uma saudade, um aperto no coração, um desejo de tocá-lo, de senti-lo, de vê-lo face a face.

Que saudade de um tempo não vivido. Ou vivido e ainda não lembrado, numa definição meta-histórica.

Espero ansiosamente pelo dia que o verei e o conhecerei da mesma forma como hoje sou conhecido por Ele.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

O Fim da Igreja

Francis Fukuyama se tornou célebre ao publicar em 1989 o livro "O Fim da história e o último homem". Fukuyama advogava neste livro a tese de que a história encontrou seu ápice no capitalismo e na democracia ocidental liberal, como coroamento do desenvolvimento do homem e de seus sistemas. O demais a vir após isso seria somente a discussão de movimentos nacionalistas e fundamentalistas islâmicos, retrógrados e reacionários em seu cerne. Com isso Fukuyama decreta: acabou-se a história (apesar de não poder dizer que vivemos felizes para sempre).

Todo este intróito ao utilizar-se de Fukuyama é para, de forma triste e deprimente, decretar o Fim da Igreja! Não, não leia este texto como se o autor fosse um ateu marxista ou um humanista agnóstico, não. Digo isso embasado na triste constatação de que nossa sociedade mudou e com o antigo ideário das gerações passadas e suas convicções, foi-se também a crença na existência de igrejas na acepção da palavra.

Não acreditamos mais na assembléia de Deus com seu povo. Não acreditamos em "quão bom e quão suave é...". Não servimos mais a Jesus Cristo através de seu corpo, a igreja. Ele que nos sirva!

A idéia que move-se em nosso subsconsciente é a de sermos servidos. O conforto do desenvolvimento humano, a síndrome do descompromisso, igrejas drive-thru. Movemo-nos por nossos desejos neste neo-hedonismo cristão. Embasamos nossas decisões na pirâmide de Maslow, atendendo nossas necessidades fisiológicas primeiro, vemos no pastor um prestador de serviços, na igreja uma ficção jurídica contra a qual caso não responda aos nossos anseios, podemos arguir nossos direitos.

O texto que move esta multidão não é o bíblico mas o código de defesa do consumidor. Consumimos sim, serviços religiosos com a liberdade do poder de nosso descompromisso. Não queremos relacionamentos mas sim, relações de consumo, onde consumimos bens, serviços e religião.

É este o Fim da Igreja, no qual a oferta atende ao meu sonho de prosperidade, eufemismo para ganância sórdida e desmedida. Dizimo para que as 'janelas do céu" se abram sobre mim e não por amor à obra. Vou á Igreja não para servir a Deus mas para exigir destes profissionais da fé o que eles podem, e devem, me oferecer. Inclusive, não é esta a lei que rege nossos templos: oferta e procura?

"Ó razão! Onde estás tu razão?
Refugiaste-te nas bestas feras e os homens quedaram sem ti!"

Vergonha



"De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto"
Rui Barbosa
Até quando te sofreremos, ó geração perversa?
Até quando José, cancro purulento a transbordar-se sobre a carne viva do povo ferido?
"Ó razão, onde estás tu razão? Refugiaste-te nas bestas feras e os homens quedaram sem ti" diria o bardo.
Bardo, ó bardo! Onde estás tu a clamar pelas bestas feras pois os homens assumiram o congresso...
Porém, digo-lhes que as excrescências dos homens sem escrúpulos, sem vergonhas de exporem o sexo nas ruas, as suas vísceras misturadas a sangue e excremento, expôem-nos o quão vexatória é a nossa posição.
Mudos, quietos, calados, imóveis. Vergonha!

terça-feira, 9 de junho de 2009

Obama. O que pensar dele?











Não o considero o Messias, como alguns. Ele é falível.
Mas me empolgo com suas palavras.
Devo confessar que ele é o que eu gostaria de ser.

Será que não nos decepcionará?

Abaixo segue seu discurso no Cairo, uma das mais belas obras da história da oratória pela magnificência do texto e pela relevância histórica. Vale a pena ler.

http://www.estadao.com.br/noticias/internacional,veja-integra-do-discurso-de-barack-obama-no-egito,382488,0.htm

Escuridade


Adentro-te, minha alma, sem saber o que encontrar.
Enfrento o fantasma de mim mesmo,
pontos cegos de meu íntimo, lugares que não visitei com coragem resoluta,
com a convicção de dias mais claros.

És meu pecado diário, meu alter ego, meu espinho na carne.
És a face desprezada, o temor da morte, a solidão arguta.
És o terror noturno, a seta que voa de dia, a peste que anda na escuridão,
a mortandade que me assola ao meio-dia.

És minha vergonha, meu vexame.
Inimigo meu, íntimo, pessoal e privado que eu enfrento todos os dias
em uma luta perene e sem vitórias.

Ó Luz que veio ao mundo e me arranca das trevas.
Salva-me de mim mesmo!

Escuridades em cantos de minh´alma,
Trazem-me mais um dia em que não me reconheço.
Temo este outro ser que vagueia dentro em mim,
com o mesmo nome, a mesma cor, o mesmo cheiro.
Eia! Sou eu mesmo!

Temo-te, espanto-te, devoro-te com sofreguidão,
me enojo de ti,mas és um pouco de mim,
o pouco que não quero ser.

Noite escura d´alma, fruto proibido,
instrumento da compaixão e do conhecimento do bem e do mal,
este espelho de nada vale quando o observo nesta sala escura de minh´alma,
este lugar ao qual chamo ESCURIDADE.

terça-feira, 26 de maio de 2009

A falência do sistema político brasileiro. Novas alternativas

A imagem do deputado asseverando como desprezível a opinião pública brasileira impõe-nos algumas necessárias reflexões. Algumas leituras podem ser depreendidas da famigerada frase: “estou me lixando para a opinião pública brasileira”:

1 – O nobre representante dos interesses nacionais está acima das pressões populares e, embasado na altivez de seu mandato, profere esta célebre frase como que a explicitar que antes dos interesses volúveis do povo, está a defender a incólume Justiça, sim, em letras maiúsculas, pois não a instituição e o aparato judicial mas o sentimento mais nobre e puro da humanidade, misto de divino e humano.

2 – O deputado é um picareta de mancheias, um salafrário, um ser desprezível e sem escrúpulo mas com uma sinceridade digna de punição na terra dos hipócritas caras de pau. Me parece ingênuo não interpretar desta forma.

No entanto, como não me permito vencer pelo mal, mas antes vencer o mal com o bem, me arrojo contra o disparate transvestido de Estado Nacional, mais comumente chamado de Brasil.

Ainda que me pareça cada vez mais claro que o justo e o bom sejam utopias, ainda que reais, momentâneas, entendo que nossa luta contra os gigantes moinhos de vento possam ter melhor desiderato se nos centrarmos em um simples dispositivo denominado voto distrital.

A idéia básica do voto distrital é restringir o número de candidatos a um deteminado espaço geográfico e eleitores, como que naquele determinado local houvesse uma pequena eleição majoritária a determinar quem seria o candidato eleito por aquela localidade.

Imaginemos que em uma cidade como São Paulo, ao invés de termos centenas de candidatos a vereadores (diga rápido, em quem você votou na última eleição?), teríamos 55 distritos distribuídos pela cidade, sendo que cada um deles seria composto por algo em torno de 100.000 a 150.000 eleitores. Santo Amaro, por exemplo seria dividido em em torno de 10 distritos.

Os críticos deste sistema o atacam dizendo que este formato cria determinados “currais eleitorais”. Caro amigo que lê estas mal traçadas linhas, você realmente acredita que não temos currais hoje?

Dos grandes males de nosso atual sistema proporcional, elenco alguns dos mais nefastos:

1 - O voto proporcional estimula a eleição de personalidades, celebridades, indivíduos sem noção alguma de seu papel de representante das vontades do povo, somente para abocanhar votos.

2 – Este sistema então chega a eleger candidatos a deputado federal, estadual ou vereador com 100, 200 votos em SP, no rastro destas celebridades. Lembram do “Barata”, eleito no embalo da Havanir Nimitz? Você sabe quem o seu voto de “protesto” no Clodovil elegeu?

3 – Custo de campanha. Enquanto uma eleição para senador na Inglaterra custa em torno de R$ 40.000,00 uma eleição para vereador em São Paulo não sai por menos de R$ 500.000,00. Quem paga por isso? O candidato? Suas doações de campanha? Escusos grupos criminosos/econômicos com escusos interesses criminosos/econômicos?

Quando reflito e ainda percebo que países desenvolvidos como EUA, Inglaterra, Alemanha, Itália, Espanha, Holanda etc já adotam o sistema proporcional, parece-me soar que nós, brasileiros, somos os únicos seres brilhantes de toda terra!!!

Esta apologia do voto distrital é uma singela tentativa de me apegar a algo factível, real, que abandone a crítica vazia e sem sentido e apresente possibilidades de salvação a nossa combalida ética pública.

Calarmos-nos fazem-nos cúmplices das imundícias nacionais.

Gritarmos em meio às praças incomoda.

Apegarmos-nos a propostas reais e concretas de mudança, enche-nos o peito de esperança e afaga o coração daqueles que ainda embalam a pueril quimera de um país mais justo e melhor.

Non ducor. Duco!

domingo, 17 de maio de 2009

Razões de uma multidão perdida

Neste mal encenado espetáculo que se tornou a Igreja evangélica brasileira, nas quais alguns púlpitos mais se parecem com picadeiros de circo, uma pergunta me persegue: o que leva milhões de pessoas às reuniões de “poder”, aos congressos de "fogo”, às campanhas e vigílias de “unção” destes famigerados estelionatários da fé, lobos adornados com as rústicas peles de um cordeiro?

O quê os mantêm deslumbrados com tais líderes cegos mesmo após suas excrescências lhe mancharem a fronte e suas vestes se rasgarem?

Alguns fatores podem explicar o porquê e gostaria de compartilhá-los com você (mesmo que você os conteste ou os ignore).

1. A frouxidão moral do brasileiro médio

Mas em Teu nome curamos enfermos e expulsamos demônios...
Afastai-vos de mim pois não vos conheço!

Sérgio Buarque de Holanda em Raízes do Brasil divaga sobre este aspecto de nossa personalidade nacional nos termos do homem cordial. Ele chega a dizer que “a uma religiosidade de superfície, menos atenta ao sentido íntimo das cerimônias que ao colorido e à pompa exterior, quase carnal em seu apego ao concreto e em sua rancorosa incompreensão de toda verdadeira espiritualidade; transigente, por isso mesmo que pronta a acordos, ninguém pediria, certamente, que se elevasse a produzir qualquer moral social poderosa.” (grifo meu)

Este aspecto produz nossos ”rouba mas faz” e conseqüentemente o “evangelho do rouba mas faz”, o evangelho da moral frouxa em que líderes pecaminosos (ainda que haja uma rigidez moral em relação a desvios sexuais como adultérios) permanecem amados e respeitados no seio das igrejas.

Ele desvia dinheiro da igreja? Duvido! Deus faz milagres através dele...Ele tem carros importados na garagem às custas das nossas ofertas? Digno é o obreiro do seu salário...É o dom da prosperidade sobre ele pois nós somos cabeça e não cauda (ainda que quem esteja proferindo palavras como essa ainda ande a pé...).

2. A tendência natural de todo ser humano ao caminho mais fácil

O caminho largo conduz à perdição. O caminho estreito é o que conduz à salvação.

Em qualquer nação, era ou civilização, demonstrado está que o espírito do homem o conduz ao conforto próprio. Parece-me expressar uma tendência natural de auto-sobrevivência que nos impele àquilo que parece mais simples e que exija menos esforço. Nos últimos dias comecei a refletir sobre este aspecto de nossa natureza dentro da igreja, ao vislumbrar um caso que me parece muito sintomático e que tem assolado à Igreja brasileira (neste caso, até internacional).

Um senhor ao final da reunião procurou pelo pastor para relatar de sua dor e sofrimento em relação à doença de sua filha (crônica e humanamente incurável). Para nós pastores e líderes faz-se muito mais confortável fazer a oração da fé, determinar a cura, dizer ao pai que tome posse da benção e despedi-lo em paz. Ele precisa disso talvez mas ele precisa de muito mais. Nosso verdadeiro evangelho implica tomar sobre nós uma carga um pouco maior, uma cruz; implica caminhar ao lado daquele pai, chorar com ele, suportá-lo em sua dor, derramar azeite sobre suas feridas, bálsamo sobre seu corpo já inerte pela dor da filha. Viver um evangelho maniqueísta neste sentido (de um Deus neo-pentecostal que sempre cura ou de um Deus tradicional que nunca cura) é muito mais confortável e muito mais fácil. Relacionar-se com um Deus que não tem respostas imediatamente conclusivas neste caso é muito mais uma questão de fé e não somente da razão. Isto é cristianismo, o cristianismo do copo de água ao sedento, da oração na casa da viúva, do copo de vinho para Timóteo, da visita ao Paulo encarcerado e à beira da condenação, do choro ao lado de Jó.

3. A falta de Educação formal

Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará.

Uma pesquisa realizada pela ONG Ação Educativa, em parceria com o Instituto Paulo Montenegro (ligado ao Ibope) indicou que apenas 25% dos brasileiros com mais de 15 anos têm pleno domínio das habilidades de leitura e de escrita. Isso quer dizer que 1 em cada 4 brasileiros consegue compreender totalmente as informações contidas em um texto e relacioná-las com outros dados.Segundo o levantamento, 38% dos brasileiros podem ser considerados analfabetos funcionais. Quando o estrato estudado é aquele em que as pessoas tinham apenas três anos de estudo, o percentual de analfabetos funcionais chega a 83%. Mesmo entre as pessoas com quatro a sete anos de estudo, pouco mais da metade atinge os níveis básico e pleno de habilidade de leitura e de escrita. Os demais também podem ser considerados analfabetos funcionais. (Fonte: Folha de S. Paulo).

Um povo cego que sempre se verá guiado por outros cegos. Neste dantesco inferno deixamo-nos guiar por quaisquer que sejam os Virgílios. Prosperam em nossa terra líderes que não consegue interpretar a verdade explícita das Escrituras (ou não querem), que lêem textos sem acentos encontrando assim mensagens divinas guiando um povo que ouve o que quer e não o que precisa.

Dói-me perceber que em alguns casos a falta de uma educação formal, básica, que nos afastaria das condições de analfabetos funcionais. O impacto desta tragédia social em nossas igrejas se reflete em heresias, desvios de conduta, extorsões, crimes contra a palavra e contra os homens, acobertados por leituras deturpadas da palavra que conduzem milhões ao abismo. Antes que este artigo seja taxado de elitista, ressalto que o resgate da cidadania dentro das igrejas em grande parte também é responsabilidade das...

4. Elites cristãs subdesenvolvedoras
Ele te declarou, ó homem, o que é bom e que é o que o SENHOR pede de ti: que pratiques a justiça, e ames a misericórdia, e andes humildemente com o teu Deus.

As elites evangélicas brasileiras em sua grande maioria se ausentaram de seu papel enquanto sal da terra e luz do mundo e sua omissão tem custado caro. Enquanto ficamos discutindo se arminianistas ou calvinistas estão certos, se pentecostais ou tradicionais (debate que não faz sentido para a multidão descrita logo acima) o espaço já foi preenchido por outras palavras, outras mensagens, outros líderes.

Nosso evangelho resumido às nossas reuniões, às nossas palavras, à nossa fé, deveria estar somando-se ao evangelho das obras, ao evangelho da ação, ao evangelho maltrapilho feito para os pobres, os doentes, os já excluídos pelo Estado que, se não foram acobertados pelo tráfico, pela criminalidade ou pela prostituição o serão por estes líderes evangélicos. Neste diapasão nosso discurso perde a força que deveria ter pois este “evangelho” da heresia, da frouxidão moral, da falta de educação está literalmente salvando vidas, ainda que por interesses escusos enquanto o nosso...bem, o nosso...

Que Deus tenha misericórdia de nós.

Marcos Paulo Sabiá

Imerso nas lembranças - Discurso de uma formatura que não aconteceu

Imerso nas lembranças de minh'alma
pude vislumbrar o mistério contido em todos estes anos.
Quão espinhosa a coroa, quão longa a jornada a ser trilhada
por estes meus pés ainda infantis.

Jornada fatigante, senti-me um errante,
perdido em meio às trevas de minha própria noite.
Instado continuamente a ser um herói,
dão-me a espada da lei em minhas mãos e me fazem um guerreiro
mas eia! Ainda sou um infante!
E tal qual busco saciar minha fome e sede nos seios da mãe Justiça,
aplacar minha ira e indignação no colo da verdade.

Pude perceber, caro amigo a quem derramo minh'alma,
que construímos nossas vidas como um castelo,
erguido sobre quatro pilares: Deus, pais, mestres, amigos.

Mestre, doaste a ti mesmo.
Fizeste-me menos de mim para que recebesse um pouco de ti.
Foste meu guia, meu aio.
Como Simão, o cireneu, a carregar a cruz de Cristo pela via dolorosa,
como Virgílio a guiar Dante em sua jornada,
como minha mãe a segurar minha pequenina mão em meus primeiros passos.

Mestre, eterna será tua lembrança,
pois por tuas obras valerosas te vás da lei da morte libertando.
Extrapolaste aos limites das Ciências Jurídicas levando-me às veredas da Justiça,
mostrando-me quão resplandecente é a manhã daqueles que observam a verdade.
Que meu terno abraço seja a lembrança a impregnar tua memória.

Lancei os olhos sobre meus pais.
Notei que seu amor é a ciência maisprofunda que ao homem não foi dado decifrar.
Minha mãe, geraste-me em dores, concebeste-me com um sorriso,
entregaste tua vida como libação por amor de alguém ainda não conhecido
mas por quem tinhas um amor entranhável.

Embalaste-me em teus braços, deste-me teu colo, sorví de teu leite.
Foste assim minha vida, minha verdade, minha justiça.
És meu primeiro amor porém não serás o último, posto que serás eterno.
Que possa ainda amar-te um dia como mereces, ainda que em terna e saudosa lembrança.

Meu pai, meu herói. Conserva-me em teus sonhos.
Tua doce companhia e lívido sorriso me fazem navegar em águas tranquilas.
Possa eu guardar tuas palavras em meu coração, arquivo inescrutável, indelével.

Sim, amigo, Deus é Pai. Deus é Mãe.

Amigo, tu és para mim demais precioso pois fazes parte desta minha vida.
Hoje corre em minha veia o mesmo sangue,
pulsam em meu coração os mesmos desejos, os mesmos anseios.

Dividimos o pão da alegria, o fel da tristeza e comemos juntos à mesa da comunhão.
Sentamos lado a lado ainda garotos.
Após nossa caminhada juntos, largamos os brinquedos para empunharmos espadas.
Tornamo-nos guerreiros!

Mas amigo, hoje o sentimento que se derrama sobre mim é o medo.
Medo da separação, medo da distância, medo da solidão.
As noites serão mais breves, os copos mais vazios, os sorrisos menos largos.
Forjados juntos na fornalha da vida, hoje o tempo, cruel amigo, nos despede.

Se hás de me deixar amigo, deixa-me logo, pois quiçá,
conviver com tua falta me seja melhor que esperar por ela.
Mas leva-me contigo em memória, na lembrança de dias que não voltam mais.

Prostrado, pude então contemplar que o quarto pilar não sustenta somente minha vida
mas todo o mundo.

Com tuas mãos, oh Deus, sustentas todo o Universo,
demonstrando porém Tua grandeza ao aceitar como morada
o coração de um pobre homem como eu.

Nosso coração vive inquieto a Te buscar, dando-te as mais variadas
formas e nomes, nessa busca desenfreada por Ti.
Percebemos então, quando aquietado nosso coração por Tua paz,
que Tu és amor, e se não vemos Tua face, contemplamos-te no sorriso de nossos pais,
no carinho de nossas mães, no olhar de nossos mestres, no abraço de nossos amigos.

Porém não consigo chorar ao olhar o horizonte.
Ainda sem erguer a fronte, vejo o solo sobre o qual erguemos nossos castelos.
Esta Pátria Amada, Idolatrada, regada com nosso sangue, suor e lágrimas.

Somos o estopim da revolução gloriosa de amanhã.
Revolução sem dores ou desgraças. Revolução que há de tirar os filhos desta pátria de um exílio interminável em sua própria terra, que há de devolver aos braços da mãe gentil os filhos deste solo, que há de calar, não com a força virulenta das baionetas mas
com a veemência da Justiça, os clamores deste povo.

Em meio à violência que campeia e se transveste em sorrateiros atos de ilegalidade,
seremos os arautos da justiça, a proclamar de coração aberto e aplenos pulmões
a força do Direito que sobrepuja o direito da força.

Seremos os heróis desta Revolução pois guardamos em nós a lei primeira,
da Justiça que não cala ante a devassidão de governos,
que não consente com o Estado gerador de miséria e desilusão
tampouco com homens amantes de si mesmos, que engordam
com a glutonaria de sua ganância perniciosa.

Temos sim um comprometimento entranhável com os estandartes
da liberdade, daigualdade e da fraternidade, que hão de nortear a Lei,
enquanto luz para os povos.

Levantemo-nos então e ergamos o castelo de nossas vidas.
Um marco na história e uma morada para as gerações futuras.

Marcos Paulo Sabiá

As oliveiras do Monte


Descortinou-se o palco desta vida para que encenasses teus últimos atos
Perpassaste pela vida, no entanto, sem adornos que obnubilassem teu verdadeiro ser
Eras homem e era Deus. Atraía-me por tua divindade latente em teus atos e palavras
Constrangendo-me a adorar-te. Compungindo-me o peito para que rebentasse em palavras de louvor.

Me deste o carinho de um pai, o amor de uma mãe, o ombro de um amigo.
Foste assim a imaculada e sublime encarnação de Deus
Derretendo meu coração petrificado pelas desilusões
Ferido pelas mazelas de minha vida.

Aquela noite no entanto tornara-se mais tenebrosa então
Teu semblante já não transmitia o mesmo vigor
Pois agora deformado pelo sofrimento da solidão
Solidão esta tão cruel que lhe impingira esta jornada

Sofreste pela ausência da mãe em tuas primeiras noites ao relento
Saudades do conforto do lar, da companhia dos irmãos,
mas nada comparável à ausência do Pai que o acompanhara desde a eternidade
Acrescentando a tua vida a palavra abandono.

A iminência da cruz em que te verias sozinho, cruelmente abandonado
Teve assim o condão de esvair de teus olhos todo brilho,
De teu semblante a alegria perene,
De teu coração a esperança

Pediste-me que deixasse-te a sós com teu pai
A um tiro de pedra a observar tuas palavras de sofrimento
Teus clamores, teu pedido por clemência
Quiçá extrair do Pai um ato de misericórdia

No entanto pude observar a tristeza a consumir-te
O esgotamento após tuas petições serem rechaçadas
Tiveste assim a real percepção do desespero humano ao pedir e não ser atendido
Ao ser constragido em seus desejos pela vontade divinal

E pude assim então notar a magnificência de tua glória
O momento sublime de teu evangelho
A junção do homem em Deus
O gélido suor de teu corpo mortal misturado ao ardor de teu sangue divino.

Quando então percebí que terminaste tuas preces
E que em teu desiderato conheceste o fracasso
Voltei a deitar e, fingí dormir
Para que como em um sonho tudo um dia terminasse
E ao acordar pudesse vislumbrar o meu Deus, o meu amado,
voltando em meio às Oliveiras do Monte.

Marcos Paulo Sabiá

Narcocristianismo

Diz-se dos narcóticos: “substância que produz hipnose, certo grau de relaxamento muscular e narcose, que vem a ser a depressão reversível e inespecífica do sistema nervoso central produzido por drogas”.

Qual a relação das drogas com o Cristianismo, ou melhor, com o tipo de Cristianismo mais comum e rasteiro que ouvimos em nossos dias?

Pense em algo que se busque para o consolo das dores da alma, afago das tristes sensações de fracasso, que afaste, mesmo que só por alguns instantes, da realidade dura e cruel e leve, através do entorpecimento, a um mundo de delícias, quimeras de uma outra realidade. Se pensar em drogas, você está certo. Se pensar neste tipo de evangelho que se prega hoje em dia em muitos lugares, infelizmente, você também está certo!

Não por acaso, o pensador chega ao ponto de chamar a religião de “ópio do povo” e, ao vislumbrar algumas de nossas reuniões neo-pentecostais, recheadas de manifestações místicas, pseudo-sobrenaturais e extra-sensoriais, eventos de “poder”, congressos de “fogo”, reuniões que oferecem todo tipo de sortilégio religioso e prometem abalar o país, percebo uma multidão de almas que está à busca de nada mais do que uma experiência, uma sensação, efeito muito apropriado a um narcótico, muito diferente de um relacionamento com Deus, genuíno Cristianismo. Disso, pseudo-evangelho, parca e pobre expressão neo-pentecostal, aproveito-me para designar de “narcocristianismo” ou “narcoevangelho”, ou seja, religião com a promíscua finalidade de oferecer uma experiência, necessariamente efêmera, que possa retirar o homem de sua realidade e transportá-lo por alguns instantes para outra realidade através de um torpor, próprio de um estado de transe, hipnose ou coisa que o valha.

É próprio deste “narcocristianismo” experiências rasas, superficiais, mas que se propõe inesquecíveis, marcantes, mas que cedem ao primeiro choque de realidade, que faz com momentos depois do ápice de sua “utilização” precisem ser renovadas, dia após dia, pois trazem nada mais que um gozo fugaz. Seu resultado é um gosto residual amargo, que torna seu “usuário” dependente de novas experiências, cada vez mais fortes, inesquecíveis. O dente de ouro já não fascina? Rolaremos no chão! Já ouviu alguém rugir como leão no altar? Se alguém não fez isso na sua igreja ainda, você está por fora e é um tremendo careta...

Sob a perspectiva do verdadeiro Cristianismo, que privilegia o relacionamento e não a experiência, antes o “eu Te conhecia de ouvir falar mas agora meus olhos Te vêem...”, nada mais cruel do que formarmos um exército de crentes nas filas dos “templos drive-thru”, alimentando-se não do pão da vida mas com sofreguidão de um odioso e repugnante fast-food espiritual que incha mas não sacia a fome espiritual de um povo evangélico sem Deus, por mais paradoxal que isso possa parecer.

Este é o retrato das Igrejas S/A, que com foco em seu cliente e em busca de market-share, se utilizam de ousadas estratégias de marketing que fidelizam o cliente mas não o convertem, que arrebatam sua alma mas não salvam seu espírito, que massageam seu ego mas não lhe opõe a santidade de Deus.

Este é um evangelho sem dores, um evangelho sem cruz, aquinhoado em palácios e longe de estrebarias, sem poder, sem graça (em todos os sentidos), pintando um possível mundo sem aflições, que depois da overdose o que resta é um ser sem a alegria da salvação, sem a paz que excede todo entendimento e que percebe que para suprir este vazio terá de sair em busca de uma nova dose de “narcocristianismo” à venda na esquina mais próxima.

Este não é o grito de um reacionário tradicional mas de um apaixonado pentecostal. No poder do Espírito trago esta palavra para que ela seja a voz de Deus, ouvida em meio ao ensurdecedor barulho da “rave” da qual participam tantos e tantos, reunião após reunião, crendo ou sendo levados a crer, que ela não passa de mais uma reunião de poder.

Que Deus tenha misericórdia de nós, fiéis que engrossam as fileiras de igrejas que mais se assemelham a casas de recuperação espiritual, lugares em que pregamos para quem já se batizou, nos quais trazemos a palavra para quem já tem algumas Bíblias de estudo. Lugares aonde nos reunimos para ser família e não corporação.


Marcos Paulo Sabiá

Que é a verdade? Quid veritas est?


Talvez esta questão não tenha ecoado em teu ser com todo o poder e reverberância possível mas pare e reflita comigo sobre esta questão: o que é a verdade?

Esta pergunta de Pilatos, emanada da alma de toda humanidade, encerra séculos de caminhada do homem sobre a Terra.

Se fores questionado quanto à verdade, terás a mão a realidade para conceituá-la e assim como Vico dizer "verum ipsum factum", amoldando-se ao pensamento mais comum de que a verdade é aquilo que está conforme a realidade. Mas será esta a verdade?

A realidade é nada mais que o substrato de fatos, valores e informações que compõem o mundo inteligível. Ressalte-se que esta realidade é fruto de fatos temporais, valorados por um grupo que dispõe de dadas informações, daí que chego à conclusão de que não pode a verdade resumir-se a isto somente.

Primeiro porque os fatos, localizados que estão no tempo podem sofrer a atuação deste. O fato de não conseguirmos ir à Lua durante milhares de anos deixou de ser verdade há menos de meio século. Portanto, restringir a verdade a fatos empobrece-a, limita-a, reveste-a de um relativismo impróprio à verdade suprema e imutável que buscamos.

A verdade também não pode restringir-se a coisas, considerando-se que a verdade não pode ser materializada. Materializá-la significa restringi-la ao espaço. Feito isto, fazemo-la relativa pois a partir do momento que a verdade restringe-se à matéria deve necessariamente ocupar um dado espaço em dado tempo e, sendo assim, relativiza-se.

A verdade não pode tampouco construir-se sobre valores, sob pena de erigirmos dogmas, axiomas que em nada contribuem na busca da verdade. Os valores são construções lógicas de um dado grupo humano de acordo com suas crenças, circunstâncias as quais este grupo assume e as faz suas, variáveis assim de acordo com cada grupo e assim mutáveis no tempo e no espaço, de acordo com aquelas variáveis. Construir a verdade sobre valores significa erigi-la sobre um edifício erguido pelas mãos dos homens e, portanto, passível de destruição.

Por fim, a verdade não pode erigir-se sobre as informações reunidas em dado momento, considerando-se que estas possam ser reais ou não, sempre incompletas, a levar-se em consideração que o desenvolvimento do conhecimento há de demonstrar que em todo grupo de informações a parcela de ignorância anterior demonstrar-se-á cada vez maior. As informações das quais dispomos hoje a respeito do descobrimento do Brasil fazem com que muito do que acreditávamos verdadeiro se demonstrasse hoje em mentiras e falácias.

Assim sendo, este raciocínio me leva a crer que a verdade suprema deva ser: eterna (não restrita ao tempo), imaterial (não restrita ao espaço), absoluta (imarscescível e incontestável) e plena (completa e acabada).

Daí que a verdade suprema, eterna, imaterial, absoluta e plena somente pode encontrar guarida na excelência do Deus Eterno que se fez carne e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade. No momento em que Jesus Cristo reinvidicou a si mesmo toda a verdade ao dizer ser ele mesmo a verdade revelou-nos o segredo de toda existência, descortinou-nos a única possibilidade de revelar-nos a verdade. Para ser completa, ela teria de estar em Deus, desde a eternidade, revelada em Cristo.

É Ele a totalidade indivisível de Hegel, a fonte de todas as verdades de Agostinho, a verdade dos fatos de Vico, a resposta à questão de Pilatos (Quid veritas est?). Eis a verdade encarnada, exaltada em glória, santa, pura e imaculada. Eis a verdade que não cessa e que em si encerra todo o poder e autoridade nos céus e na terra. É Ele, e somente Ele poderia ser, a verdade, nada mais que a verdade. Esta espada afiada que sai de sua boca, ainda que por vezes envolta nas névoas da dúvida e do mal, há sempre de rasgar os céus fazendo divisão entre alma e espírito, juntas e medulas, e por fim, vencer todo o engano quando vier ela, a verdade, sobre as nuvens com poder e grande glória no momento em que todo o joelho se dobrará e toda língua confessará que Jesus Cristo, a verdade, é o Senhor.


Marcos Paulo Sabiá